- Detalhes
- Categoria: Blog
- By CRF-SP
Farmacêutico Lucas Ercolin fala ao CRF-SP sobre a experiência ao deixar a Ucrânia
Dr. Lucas Ercolin é farmacêutico e atualmente está na Polônia, após sair da Ucrânia por causa do conflito com a Rússia
Há nove dias, em 24 de fevereiro, iniciou-se a invasão militar da Ucrânia pela Rússia. Em meio a tanques, mísseis, explosões e sirenes está uma população que já sofria os impactos de uma região permeada por conflitos.
Entre os mais de 500 brasileiros que viviam na Ucrânia, estava o farmacêutico Lucas Ercolin, que atua em uma missão humanitária como gerente de projetos em saúde em Kostyantynivka, na região leste da Ucrânia, em uma pequena vila que se destaca pelos seus murais coloridos sobre corrida espacial. Ele também atuou no Iraque e Iêmen em missões anteriores.
Como não existe farmácia pública na Ucrânia, um dos trabalhos da ONG é distribuir vouchers para a compra de medicamentos para idosos, pessoas com necessidades especiais, crianças com menos de cinco anos, pessoas que precisam de cirurgia, além de grávidas e lactantes que também recebem auxílio para a realização de pré-natal e do parto. Além disso, até 2021, Dr. Lucas também participava de ações em relação à saúde mental que envolvem o autocuidado e gerenciamento de estresse, primeiros socorros psicológicos, programas de ação para reduzir lacunas em saúde mental e violência de gênero.
Dr. Lucas é membro da seção de Farmácia de Emergência e Militar da Federação Internacional de Farmacêuticos (FIP), membro honorário da Federação Internacional dos Estudantes de Farmácia (IPSF), secretário do Young Pharmacists Group (YPG) da FIP e vice-coordenador do GTT Jovem do CRF-SP.
Em meio aos conflitos, para sair da Ucrânia, ele precisou viajar dois dias de carro e enfrentar 15 horas de trem para chegar à Polônia, onde se encontra em segurança. O farmacêutico contou como foram os últimos dias no país e a situação atual. Confira:
Como era o seu trabalho na Ucrânia antes da invasão russa?
Na Ucrânia, antes de começar o conflito com a Rússia, estávamos a caminho da estratégia de saída humanitária prevista para 2023. As atividades estavam diminuindo focando nos grupos mais vulneráveis, como grávidas e lactantes, e pessoas acima de 60 anos. A principal atividade era a distribuição de vouchers para medicamentos, que podiam ser obtidos de graça nas farmácias ligadas ao projeto. Agora, tudo vai mudar.
Como foi a sua experiência em meio a esse conflito? Como foi a sua saída do país?
Eu estava em Kiev quando a primeira explosão aconteceu na manhã do dia 24/02. Fui acordado por um colega e já comecei a arrumar a mala, enquanto as sirenes tocavam. Fugimos de carro sentido oeste por dois dias, e em um deles eu dirigi também. Em Lviv, ficamos dois dias e então pegamos o trem para a Polônia, em uma viagem de mais de 15 horas. Foi muito intenso, com muitas explosões, exército passando e sirene tocando o tempo todo. Nos primeiros momentos, não dava para pensar muito, mas a cada vez que parava o estresse vinha com tudo.
Poderia descrever a sua sensação ainda no país? E, agora que está na Polônia, como é a situação por aí?
Agora estou menos tenso, mas acho que vai levar algum tempo para estar totalmente recuperado. Mesmo hoje, ouvir a sirene em vídeos pela internet tem um grande impacto, demonstrando como a guerra afeta a saúde mental de forma muito intensa. Na Polônia está tudo normal, embora exista uma tensão sobre como a guerra irá impactar o país em relação aos refugiados, transporte de armas, poeira radioativa, etc.
Está sendo possível desenvolver algum trabalho humanitário na Polônia com os refugiados?
Por hora, estou cuidando das coisas mais urgentes dos projetos que já existem. Por outro lado, existe um planejamento sobre o início de uma missão na Polônia para os refugiados. Contudo, é tudo muito recente e a resposta precisa ser definida melhor - outras ONGs ou agências da ONU possuem melhores capacidades para atuar durante o conflito.
Quais as qualificações do farmacêutico para ser tornar humanitário? Quais experiências mais requisitadas?
É essencial o conhecimento de línguas, em especial o inglês, francês, falado em muitos países africanos, árabe e espanhol. Tive experiência internacional e também trabalhei como gerente de projetos e farmacêutico responsável da missão.
Atualmente, a atuação do farmacêutico em missões humanitárias não é uma atribuição definida pelo Conselho Federal de Farmácia, mas Dr. Lucas resssalta que se as necessidades humanitárias no Brasil e América Latina continuarem aumentando, o farmacêutico precisará estar incluído.
A Federação Internacional Farmacêutica (FIP) publicou documento "FIP Global Humanitarian Competency Framework” destinado aos farmacêuticos que trabalham ou desejam exercer em atividades humanitárias, disponibilizando serviços farmacêuticos durante desastres e para pessoas afetadas por conflitos armados.
Texto por Thais Noronha - Departamento de Comunicação CRF-SP