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- Categoria: Estudo e Pesquisa
- By fabio
Pesquisadores desenvolvem rota para produção de nanopartículas para tratamento do câncer
Pesquisadores mineiros desenvolveram uma nova rota para produção de um material formado por nanopartículas magnéticas de óxido de ferro que poderá ser útil no tratamento de vários tipos de câncer. Esse sistema biomédico, que está na pauta dos grandes centros de pesquisa nanotecnológica e médica do mundo, é resultado de um extenso trabalho que envolveu pesquisadores do Departamento de Química e do Centro de Microscopia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e do Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CDTN/Cnen), localizado em Belo Horizonte.
A pesquisa publicada em 2010 na revista científica Journal of Sol-Gel Science and Technology alcançou grande repercussão no meio acadêmico. “Em função da potencialidade de nosso trabalho e de seus bons resultados, recebemos de grupos relacionados com medicina e oncologia vários convites para divulgação em publicações científicas e para participação em congressos”, diz a física Nelcy Della Mohallem, professora da UFMG e coordenadora da pesquisa.
Os materiais magnéticos nanoestruturados, como os constituídos por diferentes formas de óxidos de ferro, já são empregados em procedimentos de diagnósticos, como ressonância magnética nuclear (RMN), e estão sendo testados como carreadores magnéticos de drogas e em tratamentos oncológicos com uso de hipertermia, terapia baseada no aquecimento do tumor mediante aplicação de um campo magnético de corrente elétrica para matar as células cancerígenas. Essas terapêuticas exploram duas grandes vantagens dos óxidos de ferro: a baixa toxicidade em seres humanos e a possibilidade de controlar sua magnetização. Formado por nanopartículas de magnetita – esse material magnético é composto por óxidos de ferro – inseridas em uma matriz de sílica, o nanocompósito é sintetizado na forma de pó ou de monólito, pequena peça usada em implantes em ossos atingidos por tumores.
O material possui poros regulares, que variam de 2 a 50 nanômetros de diâmetro – por isso é chamado de mesoporoso –, que podem ser preenchidos com vários tipos de fármaco. Uma etapa importante do desenvolvimento é o dimensionamento dos poros, adequado ao tamanho da molécula da droga. Os pesquisadores mineiros estão testando no material uma droga chamada doxorrubicina, antibiótico injetável usado na quimioterapia de diversos tipos de câncer. “O encapsulamento de uma droga desse tipo é importante por causa de sua toxicidade. Ao ser encapsulada e liberada de maneira controlada, conseguimos diminuir os efeitos colaterais no paciente”, diz Nelcy.
Campo externo
Nos tratamentos com hipertermia, o nanocompósito não precisa ser necessariamente preenchido com fármacos porque o combate ao tumor pode ser feito pelo aumento da temperatura no local. O modo de ação é simples. Quando o material atinge o tumor, o paciente recebe um campo magnético externo, que é gerado por um aparelho específico para esse fim. Dependendo do local da lesão, o material pode ser injetado com uma agulha ou conduzido pelo sangue com auxílio de magnetismo externo. O campo magnético faz com que as partículas magnéticas presentes no nanocompósito comecem a vibrar e se aqueçam.
“Temperaturas de 5 graus Celsius (ºC) acima da temperatura do corpo humano são suficientes para matar um tumor sem afetar as células vizinhas”, afirma Nelcy. “Mas o compósito precisa ser bem controlado, porque partículas como a magnetita podem aquecer 20o C acima da temperatura do corpo humano quando submetidas a um campo magnético, causando danos nas células saudáveis”, diz ela. Para ser eficiente e aumentar a temperatura dentro dos níveis desejados, o nanocompósito precisa ser impregnado com partículas de magnetita com tamanho, distribuição e concentração bem definidos.
Na liberação controlada de drogas, a ação é um pouco diferente. Quando o medicamento chega ao tumor, o campo magnético é aplicado e a vibração das partículas magnéticas provoca a liberação gradual da droga contida em seus poros. Em alguns casos, os dois tratamentos podem ser aplicados simultaneamente. O calor ataca as células do câncer, enquanto a droga age para evitar uma rejeição do material ou para prevenir uma infecção. “Os nossos nanocompósitos são revestidos de sílica e, por isso, são metabolizados pelo fígado e expelidos pelo organismo.”
Um dos avanços do grupo é a rota de síntese do material adotada pelo grupo, composto também pela pesquisadora Edésia de Sousa, do CDTN/Cnen, e pela química Karynne Souza, doutoranda do Laboratório de Materiais Nanoestruturados da UFMG. “Trata-se de uma rota simples e muito eficiente. Testamos o material e ele funcionou muito bem na faixa de temperatura desejada para tratamento de câncer”, diz Nelcy. O nanocompósito foi feito impregnando a sílica mesoporosa SBA-15 com uma solução contendo sulfato férrico, Fe2(SO4)3. Até o momento foram realizados testes in vitro. O grupo espera iniciar em breve ensaios com animais, que deverão ser seguidos de testes clínicos em humanos. “Nossa ideia é repassar o processo e o nanocompósito para uma indústria farmacêutica, porque uma empresa spin off – que nós até poderíamos criar – teria muita dificuldade de colocar o produto no mercado”, diz Nelcy. Todos os procedimentos são de alto custo e necessitam de elevados investimentos.
Artigo científico
SOUZA, K.C. et al. Mesoporous silica-magnetite nanocomposite: facile synthesis route for application in hyperthermia. Journal of Sol-Gel Science and Technology. v. 53, n. 2, p. 418-27. 2010.
(Revista Pesquisa Fapesp, n. 182, abril de 2011)