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- Categoria: Saúde
- By Agência Senado
Demora no diagnóstico e falhas no tratamento prejudicam portadores de lúpus
O lúpus é uma doença autoimune - quando o corpo produz anticorpos contra si - e que afeta 150 em cada 100 mil brasileiros. O desconhecimento dos sintomas pela população, a falta de preparo das equipes de saúde primária para o diagnóstico, e as dificuldades de acesso a medicamentos modernos e tratamento adequado, principalmente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), são alguns dos principais problemas enfrentados pelos doentes.
Carlos Eduardo Tenório, representante da Associação Nacional de Grupos de Pacientes Reumáticos (Anapar) é um exemplo dos transtornos causados por essas falhas. Dos 13 aos 32 anos peregrinou em busca de tratamento sem que os médicos desconfiassem de sua condição, mesmo vivendo em São Paulo. Foram 19 anos que “trouxeram sequelas irreversíveis”, afirmou.
Depois de diagnosticado, o tratamento prolongado com o corticoide, medicamento temido por seus efeitos colaterais, trouxe mais problemas ainda, levando-o pouco tempo depois a uma aposentadoria por invalidez.
- 'Corticoide'. Não suporto nem ouvir essa palavra, e acredito que muitos pacientes também não, porque sabem as reações e os danos que trazem a nós. Nosso sonho é não ter que usar ou ter o menor uso possível dessa medicação. Existem opções, mas não temos acesso – lamentou.
Por isso, a garantia a remédios mais modernos são essenciais para a qualidade de vida de pacientes com lúpus, e nisso tanto o Sistema Único de Saúde quanto os planos de saúde são falhos, frisou. Carlos Eduardo mencionou casos em que operadoras privadas de saúde autorizaram a utilização de um medicamento, a internação e o tratamento e depois suspendem o atendimento sem justificativas plausíveis.
- As operadoras brincam com os pacientes. Liberam um tratamento e o interrompem, nos largam no meio do caminho – lamentou.
Carlos Eduardo defendeu a aprovação de uma legislação federal sobre o tema. Hoje, há alguns estados com legislação própria, quase sempre sem regulamentação, o que a impede de ser praticada.
Doença
Roger Levy, médico e professor na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, explicou que a doença é complexa, mas ao contrário de alguns anos atrás, quando 50% dos doentes morriam, hoje a expectativa de vida chega a 90%. Antes se morria da atividade da doença, hoje essa mortalidade é de 20%, revelou ainda.
A enfermidade tem origem genética, atinge mais mulheres do que homens, numa proporção de 10 para 1, e é mais frequente nas populações afrodescendentes e hispânicas. Afeta principalmente a pele, as mucosas, os rins e o sistema nervoso central.
No entanto, lamentou, o que causa mais mortes são os efeitos colaterais do tratamento, principalmente o uso prolongado de corticoides, para tratar as inflamações. A utilização frequente ataca os rins, muitas vezes de forma irreversível, e causa outros males como sangramentos gastrointestinais, desgastes ósseos e nas articulações e osteoporose, afeta os olhos, causa hipertensão, além de ocasionar depressão, insônia e outras complicações.
- Podemos melhorar a atividade da doença, mas o dano acumulado, irreversível, vai aumentando ao longo do tempo, pelo uso do corticoide. E o tratamento não pode ser pior que a doença – opinou Roger Levy.
A confirmação da enfermidade pode ser feita por exames de laboratório, e o diagnóstico e tratamentos rápidos são fundamentais para garantir qualidade de vida ao doente, frisou o médico Eduardo Borba, presidente da Comissão de Lúpus da Sociedade Brasileira de Reumatologia. Isso evita traumas permanentes a órgãos vitais, como os rins. Ele também defendeu a oferta de medicamentos variados para o tratamento, como imunossupressores, e especialmente para o problema renal, que pode evoluir rapidamente para uma falência permanente.
Borba revelou ainda que a mortalidade de um portador de lúpus é de cinco a dez vezes maior do que na população em geral, mesmo sob tratamento. De 18% a 33% enfrentam situação tão crítica que se tornam incapazes para o trabalho, ou seja, um terço dos doentes, em idade ativa, não pode exercer atividades laborais. As mulheres jovens, de até 30 anos, são as mais afetadas, lembrou ainda. Mas, ao contrário de alguns anos atrás, hoje elas podem engravidar.
Walter Lyrio do Valle, representante das instituições de autogestão em saúde, pediu atenção do governo para a questão tributária, que encarece as medicações para as doenças raras e praticamente inviabiliza tratamentos ou sobrecarrega o SUS com demandas judiciais. Ele chegou a pedir a quebra de patentes, a exemplo do que aconteceu no tratamento com a Aids.
Também frisou que o Estado deve fiscalizar a formação médica, tanto pública quanto privada, hoje considerada deficiente.
- Hoje médico não põe mais a mão em doente. Não sabe examinar, e se um paciente chega com doença rara, então... – lamentou.
Leis
O senador Romário (PSB-RJ), autor do requerimento para a realização da audiência, anunciou na reunião a apresentação de projeto de lei para beneficiar os portadores de lúpus. A proposta prevê, entre outras ações, o saque do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para os portadores, prioridade no preenchimento de vagas do Programa Universidade Para Todos (Prouni) e isenção de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para a aquisição de automóveis.
- Eu entendo a dor dos pacientes pela falta de política pública e pela falta de interesse de órgãos que se dizem competentes, mas que infelizmente não tem competência nenhuma. Espero que leis como essa possam ser de grande beneficio e importância para os portadores – disse.
De tanto ouvir reclamações sobre o atendimento precário aos doentes, nos dois sistemas de saúde, o senador fez um desabafo:
- O SUS é na verdade um faz de conta. Ele é a cara do nosso governo hoje, o PT ( desculpem aí os petistas).
Para a reunião também foram convidados representantes da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e do Ministério da Saúde, que explicaram protocolos de atendimento e detalharam números de beneficiários atendidos.
Fonte: Agência Senado