- Detalhes
- Categoria: Mercado Farmacêutico
- By Fábio Reis
Estudo da Interfarma revela que pacientes brasileiros esperam mais de dois anos para ter acesso a medicamentos inovadores
Relatório mostra que atrasos em diferentes etapas, desde a definição de preço à atualização de protocolos clínicos, comprometem a chegada de novas terapias ao SUS. No momento da análise, 67 protocolos aguardavam publicação, com uma média de 22 meses de espera
O caminho para que um medicamento inovador chegue ao paciente brasileiro passa por diferentes etapas: do registro regulatório à definição de preço, da análise de incorporação à compra e distribuição no sistema público de saúde. Cada fase cumpre um papel essencial para garantir o efetivo acesso, mas o processo é lento e, em alguns casos, a soma da espera pode ultrapassar dois anos.
É isso que revela o estudo inédito “Tempos de Acesso: A jornada que separa a inovação do paciente brasileiro”, realizado pela Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa – Interfarma, em parceria com a IQVIA, que mapeou quanto tempo, em média, cada etapa leva até que o medicamento esteja efetivamente disponível para os pacientes. O levantamento tomou como base os medicamentos registrados em 2024 nas categorias produtos novos, biológicos e de terapias avançadas.
Segundo o estudo, após o registro sanitário pela Anvisa, os medicamentos levam em média cinco meses para terem preço definido pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED). Entre os analisados, 26 produtos novos e 21 biológicos já haviam sido precificados até abril de 2025. No entanto, 13 medicamentos ainda aguardavam definição de preço.
Quando o foco recai sobre a análise da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), responsável por definir se os medicamentos serão incorporados ao sistema público, o cenário também é moroso: o processo consome em média 250 dias, ou pouco mais de oito meses. Embora esteja dentro do prazo legal (até 270 dias) há submissões externas que chegam a ultrapassar 300 dias até uma decisão.
“A motivação para este estudo foi entender, com dados concretos, quanto tempo leva para que a inovação chegue até o paciente. Cada etapa é importante para garantir o acesso adequado, mas é preciso trabalhar em conjunto com diversos atores do ecossistema de saúde para que o acesso seja mais rápido, porque, no fim, para muitos pacientes, tempo é vida”, destaca Helaine Capucho, diretora de Acesso ao Mercado da Interfarma.
Mesmo quando há parecer favorável para a incorporação de um medicamento, o acesso ao tratamento ainda não está assegurado. Para que a tecnologia chegue de fato ao paciente, é necessária a atualização dos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDTs). O estudo, que analisou decisões da Conitec entre 2018 e 2024, mostra que essa etapa leva em média 16,5 meses. Ainda assim, 67 medicamentos aprovados nesse período seguem sem inclusão nos PCDTs, acumulando atrasos médios de 22 meses.
Os tratamentos mais prejudicados são os de Infectologia, que acumulam em média 40 meses de espera, seguidos pelas áreas de Hematologia e Onco-Hematologia, com atrasos de 22 e 21 meses, respectivamente. Em Oncologia, o prazo chega a 18 meses, enquanto em Doenças Raras a média é de 14 meses.
“O estudo nos ajuda a compreender, com clareza, onde estão os principais desafios e oportunidades de melhoria. Mais do que apontar números, ele reforça a necessidade de construirmos juntos soluções que reduzam prazos e permitam que os pacientes tenham acesso mais rápido à inovação”, afirma a diretora de Acesso da Interfarma.
O relatório foi apresentado durante o 12º Congresso Todos Juntos Contra o Câncer, no painel “Do advocacy à prática: fortalecendo associações de pacientes e superando barreiras no acesso às inovações”. O encontro promoveu um espaço de diálogo entre diferentes atores do ecossistema de saúde, com a participação de Helaine Capucho; Luciana Holtz, presidente do Instituto Oncoguia; Dra. Marisa Madi, diretora-executiva da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC); Pedro Urson, Oncologista no Hospital Israelita Albert Einstein e Roger Miyake, Médico e Diretor de Acesso e Relações Governamentais da Bristol Myers Squibb.
Ao longo da discussão, os painelistas debateram os achados do estudo e destacaram que a jornada de acesso ainda é marcada por atrasos significativos em todas as etapas, desde a definição de preço até a efetiva disponibilização dos medicamentos no SUS. Foram discutidos casos reais que ilustram como a demora compromete a vida dos pacientes, a necessidade de fortalecer as associações e dar voz à sociedade civil, além da importância de propostas conjuntas entre governo, comunidade médica, pacientes e a indústria para superar barreiras. “De nada adianta debatermos novas tecnologias se elas não chegarem até os pacientes. Precisamos olhar para esses dados e propor soluções para que isso saia do debate e entre na ação efetiva”, conclui Helaine.