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- Categoria: Saúde
- By Fiocruz
Brasil corre risco de agravar doenças por falta de saneamento
O Brasil corre o risco de ter o agravamento das doenças emergentes e reemergentes caso não seja efetivado um plano de saneamento, principalmente para curto e médio prazo. O alerta é do engenheiro sanitarista da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Alexandre Pessoa, após o não acatamento de algumas medidas O Brasil corre o risco de ter o agravamento das doenças emergentes e reemergentes caso não seja efetivado um plano de saneamento, principalmente para curto e médio prazo. O alerta é do engenheiro sanitarista da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Alexandre Pessoa, após o não acatamento de algumas medidas sugeridas pela Fiocruz para o Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab).
O pesquisador destacou que a principal emenda apresentada pela instituição, a de que o abastecimento de água e o esgotamento sanitário enquanto direito humano - de acordo com resolução da Organização das Nações Unidas (ONU) -, não foi acatada. O argumento do governo foi de que os princípios fundamentais do saneamento não caberiam na revisão em seu primeiro período de implementação: levando a rediscussão para 2033. “Houve relutância em considerar o direito humano enquanto princípio fundamental, bem como ser a principal orientação de sua operacionalização. O Brasil votou favoravelmente à resolução em 2010 e, portanto, há obrigações do país a esse respeito, perdendo-se uma importante oportunidade de o saneamento ser considerado uma prioridade de política pública a ser garantida pelo Estado”, afirmou Alexandre.
Entre as medidas acatadas, conforme observou o pesquisador, o objetivo 3 - assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todas e todos, em todas as idades - dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) passou a ser incorporado, uma vez que, na versão apresentada pela equipe técnica do Ministério do Desenvolvimento Regional, não tinha sido considerada. “Na nossa proposta, nós solicitamos a inserção da medida pela compreensão de que saneamento e saúde são indissociáveis”.
Um segundo item importante, ressaltou o engenheiro, foi a retirada do Plano as citações de medidas provisórias que estavam em tramitação no congresso nacional que ainda estavam em tramitação. Ao serem aprovadas, essas medidas promoveriam uma série de alterações no marco regulatório sob uma ótica de privatização do saneamento.
“Para nós, caberia ter como referência somente a lei de saneamento, que é um importante marco regulatório do saneamento no Brasil. A retirada dessas MPs não elimina as preocupações quanto à possíveis revisões e novos projetos de lei que tem uma concepção privatista das políticas de saneamento. Há a possibilidade de se tornar um obstáculo para grandes extensões do território nacional que precisam do saneamento público, mas não são de interesse do setor privado, porque não tem rentabilidade. Isso acaba impactando, principalmente, as populações de maior vulnerabilidade”, argumentou.
Alexandre chamou atenção para uma das emendas que não foi acatada: assegurar o acesso de todos aos serviços de saneamento e soluções em esferas da vida para além da moradia. Ele argumentou que essa medida é importante pois faz referência às populações de rua, aos espaços públicos, locais de trabalho, presídios, escolas, estabelecimentos de saúde etc. “O governo acatando parcialmente inseriu a intenção da emenda como sugestão a ser incorporada visando desenvolvimento de estudos nessa temática, como parte para a próxima revisão do plano”, explicou.
O pesquisador também criticou o fato de não terem sido acatadas nesta revisão as estatísticas de acesso ao saneamento segundo variáveis socioeconômicos de renda, cor da pele, gênero, nível de escolaridade, população indígena x não indígena, população em situação de rua, migrantes e refugiados. O sanitarista explicou que é necessário apresentar e fortalecer o monitoramento das desigualdades sociais no país.
De acordo com ele, isso precisaria ser expresso em um documento, mas o governo argumenta que não existem dados comparáveis e que caberia essa avaliação a partir do próximo Censo, que ocorre em 2020.
“Esse tipo de raciocínio, em vez de fortalecer o Plansab, na avaliação real de um país que têm diversas desigualdades sociais, peca por trabalhar com valores de média que não expressam diretamente as vulnerabilidades socioambientais. Para conhecermos melhor as desigualdades no Brasil precisamos ter um olhar mais atento para o saneamento”, advertiu.
Saúde indígena
Outra medida não acatada proposta pela Fiocruz foi sobre a saúde indígena. O argumento para a não aceitação, segundo Alexandre, é que os dados sobre saneamento indígena estarão incorporados em indicadores auxiliares, e serão analisados anualmente em relatórios de avaliação.
Para o pesquisador, essa decisão invisibiliza as condições de acesso ao saneamento dessas populações. “Consequentemente, perde-se, também, a oportunidade de fortalecer políticas específicas para populações que sofrem não somente pelo esgotamento sanitário inadequado, por problemas graves de contaminação dos corpos hídricos, incluindo os processos de poluição química decorrentes das fronteiras agrícolas que utilizam agrotóxicos e da mineração que avançam sob os territórios indígenas”, afirmou.
Necessidades de investimentos
A proposta apresentada pelo governo inverteu os percentuais estabelecidos na versão original do Plansab em 2013, estabelecendo 60% dos recursos em saneamento a serem aportados pelos agentes internacionais, prestadores de serviço, orçamentos estaduais e municipais e setor privado, ficando os agentes federais somente com 40%.
A tentativa não acatada apresentada pela Fiocruz como emenda substitutiva de voltar aos percentuais iniciais do Plansab, partiu da justificativa de que a carência de recursos públicos dos estados e municípios é agravada pela crise econômica e pelo desequilíbrio da distribuição tributária, cabendo à União o aporte maior de recursos, pelos preceitos constitucionais da solidariedade e subsidiariedade. Associado a isso, houve uma redução de forma expressiva dos recursos dos agentes.
Plansab
Em março deste ano, o Ministério do Desenvolvimento Regional abriu uma audiência pública para colher contribuições para a primeira revisão do (Plansab), principal instrumento da política pública de saneamento básico, que contempla o abastecimento de água potável; o esgotamento sanitário; a limpeza urbana e o manejo de resíduos sólidos; e a drenagem e o manejo das águas pluviais urbanas.
O processo de avaliação das novas medidas do Plansab funciona a partir de um documento de referência com as atualizações do plano que o governo apresenta. Tem como objetivo a universalização do fornecimento dos serviços de saneamento básico à população brasileira até 2033.
Por: Matheus Cruz (Agência Fiocruz de Notícias)